O
padrão original, foi mandado erigir por D. Dinis, no local onde repousava Iria,
com altura suficiente para que o rio, na sua maior enchente, não o pudesse
cobrir. Em 1644 foi refeito em cantaria lavrada, sendo-lhe colocada em cima a
imagem da Santa Padroeira.
Lenda de Sta. Iria
No ano de
637, o mês de Agosto fora excecional quente. Num fim de tarde, os rubores do
sol pareciam tingir de sangue a água do rio Tejo. A serene e formosa enseada do
Pego aparecia como um luminoso lago sanguíneo.
Vindo das
bandas de Nabância, (atual Tomar), um romeiro ajoelhou-se à beira do rio, em
frente ao lugar onde, sete anos atrás, fora achado um maravilhoso túmulo de
alabastro róseo, boiando qual baú de cortiça. Nesse túmulo, parecendo
adormecida, a doce Iria aguardava a chegada de seu tio, o santo abade Célio. O
bondoso Célio aproximava - se acompanhado de uma multidão de cristãos. Em
sonhos, ele tivera a revelação de todo o martírio de Iria, a mais amada das
virgens.
Nesse
sonho, ele vira Iria a donzela, bordando nos claustros do mosteiro das Donas de
Nabância. Ajoelhado junto de Iria, estava o jovem Britaldo que, muito
apaixonado, implorava a Iria que o aceitasse por esposo. Apressou-se a bela
Iria a explicar que era impossível, pois fizera voto de castidade. Entregara a
Cristo a sua vida. Triste, triste de morrer, Britaldo regressou ao seu castelo.
Logo, adoeceu gravemente.
Na vida
monástica, Iria rezava e trabalhava. Por inspiração de Deus pede à sua abadessa
e vai falar ao moribundo Britaldo. Com doçura e firmeza convence-o de sua razão
e diz-lhe que tenha fé. Britaldo confia em Iria e retoma as suas atividades
como castelão nabantino.
Ao ver
esta cena, em sonhos, o abade Célio louvou a Deus. Porém, a revelação seguinte
foi muito cruel para o seu coração de homem santo. Ele assistiu ao assédio
despudorado que o monge Remígio, professor de lria, faz à donzela. Ela recusa-o
energicamente. O malvado Remígio, com suas malas-artes de alquimia, prepara um
pó que mistura na comida da sua aluna.
Então, o
ventre da jovem cresceu como se estivesse grávida. Muitos a acusam. Ela
proclama a sua inocência. Mas a calúnia chega aos ouvidos de Britaldo. Louco de
raiva, a sua paixão transformada em ódio, Britaldo ordena ao seu criado Banão
que vá matar Iria. Banão crescera junto de Iria, amava-a como a uma irmã.
Iria a
mais amada, Iria tão desgraçada! Sem coragem para desobedecer a seu amo, Banão dúvida
da honradez de Iria. Ao alvorecer, surpreendeu-a, quando, pela margem do Nabão,
ela rezava e caminhava em direção à capela da Imaculada Conceição aonde ia
meditar. E tantas eram as suas preocupações, que nem sentiu os passos do
malvado que de um só golpe a trespassou. Depois, tomado de remorso e de espanto
quis fazer desaparecer o corpo casto de Iria, fazendo-o mergulhar nas águas do
Nabão.
Tudo isto,
o abade Célio contemplou no seu sonho. E mais lhe foi dado ver. Os anjos
depositaram Iria num túmulo róseo e milagroso. Era de pedra mas vogava sobre as
águas dos rios como se fosse o berço do lendário Ábidis. Os anjos
acompanharam-na na descida dos rios até que para num pego do Tejo, em frente do
lugar de Seserigo, onde se levantava um grande penedo.
Após esta
revelação, o abade fez divulgar o milagre e veio de Nabância a primeira romagem
a Santa Iria. Era vontade de Célio levar Iria para o seu mosteiro. Queria
glorificá-la e pedir perdão pelos martírios que a virgem sofrera. Talvez, por
castigo divino, ninguém conseguiu tirar a bela Iria do seu sepulcro. Apenas o
abade recolheu uma madeixa de loiros cabelos e alguns pedaços do seu vestido.
Reliquias que foram guardadas através dos séculos na Igreja que, em Tomar, tem
por patrono Santa Iria.
Mas quem
era o romeiro que se ajoelhava, sete anos após a morte de Iria, no seu lugar
sagrado?
Acredita a
gente simples que era o seu matador. Falam dele os "rimances" do
Cancioneiro Popular Português. Almeida Garrett recolheu algumas variantes.
Narrativas poéticas do povo que ama e canta os seus amores.
"
Chamavam-me lria, lria afidalga.
Por aqui
agora, Iria a coitada.
Andando,
andando, toda a noite andava,
Lá por
madrugada que me atentava...
Tirou do
alfange, ali me matava;
Abriu uma
cova onde me enterrava.
No fim de
sete anos passa o cavaleiro,
Uma linda
ermida viu naquele outeiro.
Que ermida
é aquela de tanto romeiro?
É de Santa
Iria, que sofreu marteiro.
-Minha
Santa lria, meu amor primeiro,
Se me
perdoares, serei teu romeiro
- Perdoar
não te hei-de, ladrão carniceiro,
Que me
degolaste que nem um cordeiro."
Curiosidade
Parece-nos
interessante esta versão da Lenda de Santa Iria, pois parte da narrativa é
localizada num ponto concreto da Ribeira. Lugar de evocações milenares. Nele
ressoa o nome de Santa Iria ou Santa Irene. Nome tantas vezes proferido. Nome
tão enraizado no coração e na fé do povo que com ele passo a denominar a
própria cidade que de Scallabis passou a Chantirene, e em breve, a Santarém.
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